Essa situação é resultado de uma estiagem prolongada que assola o Amazonas e coloca várias comunidades em estado de vulnerabilidade. Segundo um boletim do governo estadual divulgado no último domingo, 59 dos 62 municípios amazonenses estão em situação de emergência e cerca de 158 mil famílias foram afetadas.
Coincidentemente, esse cenário está ocorrendo durante o período em que o fenômeno El Niño está se intensificando. O El Niño é caracterizado pelo enfraquecimento dos ventos alísios e pelo aquecimento anormal das águas superficiais do Oceano Pacífico. Essas mudanças têm consequências no tempo e no clima em diferentes partes do planeta, afetando a dinâmica das massas de ar e a distribuição das chuvas.
De acordo com o geógrafo Marcos Freitas, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), apenas o El Niño não é suficiente para explicar a situação do Rio Negro. Ele acredita que a estiagem na região do Amazonas está relacionada ao aquecimento global do planeta. Isso ocorre porque as chuvas na região são formadas pelo deslocamento de massas de ar provenientes do Atlântico, ao invés do Pacífico.
Marcos Freitas é especialista em recursos hídricos e coordenador executivo do Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais (Ivig) do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia (Coppe). Ele também faz parte do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) desde 2008.
Em 2010, o Rio Negro enfrentou outra seca severa e Marcos Freitas coordenou um estudo para avaliar a situação. Na época, o rio atingiu um nível de 13,36 metros, o mais baixo até então. Agora, com a experiência adquirida, ele avalia o cenário atual e afirma que o aumento no aquecimento do Oceano Atlântico e o desmatamento também podem estar contribuindo para essa crise.
Com a falta de chuvas, a temporada de incêndios florestais tende a se prolongar. Isso ocorre porque o clima seco favorece o desmatamento, que por sua vez estimula o clima mais seco. Sem as chuvas, a madeira das árvores perde umidade e a evapotranspiração das plantas diminui, resultando em uma redução das chuvas na região.
O pesquisador ressalta a importância de reduzir a taxa de desmatamento e promover o retorno da vegetação nas áreas degradadas para ajudar a recuperar a umidade na região. Ele também destaca a necessidade de se preparar para o isolamento das comunidades ribeirinhas, que sofrem com a falta de energia elétrica e o desabastecimento de combustível devido aos rios secos e ao transporte por embarcação inoperante.
É preciso tomar medidas urgentes para ajudar essas populações a atravessarem esses períodos difíceis, como o apoio ao uso de energia renovável, a conservação de alimentos e outras ações que possam minimizar os impactos dessa crise na qualidade de vida das comunidades. A situação do Rio Negro é um sinal alarmante das mudanças climáticas e da importância de se adotar medidas para mitigar os efeitos do aquecimento global.